Em um cenário financeiro desafiador, a aplicação da Lei nº 14.181/2021, conhecida como Lei do Superendividamento, em casos específicos, como aqueles envolvendo dívidas com garantia, no caso, gravadas com alienação fiduciária, demanda uma compreensão clara para evitar confusões. É crucial focar na interseção entre esses dois elementos, destacando que as dívidas com garantia de bens não se enquadram no procedimento da Lei do Superendividamento.
As leis de alienação fiduciária, regidas pela Lei 9.514/97 e modificadas pelas Leis 13.465/17 e 14.711/2023, visam salvaguardar credores contra inadimplemento. Contudo, sua aplicação conjunta com a Lei do Superendividamento requer análise cuidadosa para evitar interpretações conflitantes.
O superendividamento, especialmente em dívidas de consumo, apresenta desafios adicionais. É fundamental destacar que, nas dívidas com garantia de bens, as quais estão fora do escopo da Lei do Superendividamento de acordo com parágrafo primeiro do art. 104-A, vejamos:
‘Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas.
§ 1º Excluem-se do processo de repactuação as dívidas, ainda que decorrentes de relações de consumo, oriundas de contratos celebrados dolosamente sem o propósito de realizar pagamento, bem como as dívidas provenientes de contratos de crédito com garantia real, de financiamentos imobiliários e de crédito rural.
Neste sentido, por ser uma exceção, as estratégias e procedimentos podem divergir.
A Reclamação Pré-Processual se destaca como uma ferramenta jurídica crucial, conforme estabelecido na Resolução nº 15, de 23 de fevereiro de 2017, a qual regulamenta seu procedimento. Essa abordagem, respaldada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e alinhada à Resolução nº 125/2010, visa priorizar métodos consensuais na resolução de conflitos de interesse.
A legislação, portanto, estabelece que qualquer conflito de interesse passível de acordo pode ser submetido à conciliação, mesmo em estágios pré-processuais, como expresso no art. 1º da mencionada resolução. O CNJ, reconhecendo a excelência da via conciliatória, reforça a importância dessa prática, especialmente antes do ingresso formal em processos judiciais.
No âmbito do superendividamento, notadamente nas dívidas de alienação fiduciária, a Reclamação Pré-Processual assume um papel significativo. A Lei nº 14.181/2021, em seu art. 104-A, destaca essa abordagem como parte integrante do processo. A conciliação, neste contexto, não apenas visa evitar litígios prolongados, mas também busca equacionar as disputas de forma justa e eficiente, preservando os direitos de ambas as partes e mantendo o equilíbrio contratual.
A tentativa conciliatória, mesmo a Lei do Superendividamento excluindo essas dívidas do processo de repactuação, é um instrumento valioso para a resolução precoce e amigável dessas questões, contribuindo para a eficácia do sistema judiciário e para a mitigação do superendividamento em casos específicos, como os relacionados à alienação fiduciária.
Na eventualidade de insucesso na conciliação durante as reclamações pré-processuais, onde as partes não conseguem alcançar um acordo satisfatório, a propositura de uma ação de revisão contratual surge como um caminho jurídico viável. Este processo representa uma segunda etapa para a resolução de conflitos, especialmente no contexto das dívidas de alienação fiduciária, visando reexaminar e ajustar os termos contratuais de forma a equacionar a situação.
A revisão contratual oferece uma oportunidade valiosa para as partes repactuarem a dívida, ajustando as condições de pagamento de maneira a atender às circunstâncias específicas. Além disso, permite a discussão sobre cláusulas tidas como abusivas, assegurando que o contrato esteja em conformidade com os princípios legais e preservando o equilíbrio nas relações contratuais.
É importante ressaltar que a aplicação desse recurso se concentra na peculiaridade das dívidas de alienação fiduciária, reconhecendo as particularidades desse tipo de obrigação financeira. A ação de revisão contratual, portanto, não apenas representa uma via legal para resolver impasses persistentes, mas também contribui para a justiça e equidade nas relações entre devedores e credores, fortalecendo a segurança jurídica no cenário das dívidas complexas, como as relacionadas à alienação fiduciária.
Abordar o desafio do superendividamento em situações de alienação fiduciária exige uma abordagem específica. Ao aplicar a Lei do Superendividamento nesse cenário específico, a clareza é fundamental, enfocando a interação harmoniosa entre as legislações e evitando ambiguidades. A busca por soluções transparentes e justas, tanto durante as reclamações pré-processuais quanto, quando necessário, na revisão contratual, torna-se essencial para a preservação dos direitos e a manutenção de relações contratuais sustentáveis.
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