Nova Lei de Recuperação Judicial: Principais Mudanças e Impactos

Sancionada no final de 2020, a Lei nº 14.112 promoveu a mais significativa reforma na Lei de Recuperação e Falências (Lei nº 11.101/2005) desde a sua criação. A "nova lei de recuperação judicial", como ficou conhecida, modernizou o sistema de insolvência brasileiro, introduzindo mecanismos para aumentar a eficiência dos processos, ampliar as fontes de financiamento para empresas em crise e dar mais poder de negociação aos credores.
Para empresas que já estão em recuperação ou que avaliam ingressar com o pedido, compreender essas mudanças é crucial para a elaboração de um plano de reestruturação eficaz e alinhado à legislação atual.
A seguir, destacamos as principais alterações e a interpretação que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem dado a elas.
1. Negociação com o Fisco: Uma Nova Realidade
Uma das mudanças mais aguardadas foi a criação de mecanismos para a negociação de dívidas tributárias federais, que antes eram um dos maiores entraves para o sucesso das recuperações.
- O que mudou? A lei instituiu a transação tributária específica para empresas em recuperação judicial e a possibilidade de parcelamento do passivo fiscal em até 120 meses.
- Interpretação do STJ: Com a criação de um programa de parcelamento factível, o STJ passou a entender que a apresentação de certidões de regularidade fiscal (ou positiva com efeito de negativa) tornou-se um requisito indispensável para a homologação do plano de recuperação. Antes da nova lei, a jurisprudência costumava dispensar essa exigência. Agora, a empresa precisa comprovar que está negociando com o Fisco para ter seu plano aprovado ( STJ - REsp 1.955.325/PE). A não apresentação das certidões não leva à falência, mas à suspensão do processo até a regularização ( STJ - REsp 2.093.519/SP).
2. Financiamento DIP (Debtor-in-Possession): O Fôlego para a Crise
A falta de capital de giro é um problema crônico para empresas em recuperação. A nova lei regulamentou o chamado financiamento DIP, uma modalidade de empréstimo destinada a empresas nessa situação.
- O que mudou? A lei criou regras claras para a contratação de novos financiamentos, garantindo prioridade absoluta no recebimento para o credor que fornecer esses recursos, inclusive à frente de credores com garantia real e do próprio Fisco. Em caso de falência, o financiador DIP é um dos primeiros a receber.
- Impacto: Essa segurança jurídica visa atrair investidores e instituições financeiras dispostas a emprestar dinheiro para empresas em crise, fornecendo o capital necessário para manter as operações e executar o plano de reestruturação.
3. O "Novo" Stay Period: Prazos e o Poder dos Credores
O stay period é o período de 180 dias em que todas as ações e execuções contra a empresa são suspensas. A nova lei trouxe mais clareza sobre sua duração e prorrogação.
- O que mudou? O prazo de 180 dias agora pode ser prorrogado por igual período uma única vez. Após esse prazo máximo de 360 dias, a prorrogação do stay period só é possível se os credores, em assembleia, deliberarem favoravelmente a essa extensão.
- Interpretação do STJ: O STJ tem sido rigoroso na aplicação dessa regra, afirmando que, sem a autorização expressa da assembleia de credores, o juiz não pode prorrogar o período de blindagem. Essa mudança deu mais poder aos credores para decidir sobre a continuidade da proteção à empresa ( STJ - AgInt no AREsp 2.423.717/RO). Após o fim do stay period, execuções de créditos não sujeitos à recuperação (como os extraconcursais) podem ser retomadas ( STJ - CC 196.846/RN).
4. Maior Protagonismo dos Credores
A reforma fortaleceu significativamente o papel dos credores, que deixaram de ser meros espectadores para se tornarem protagonistas na definição do futuro da empresa.
- O que mudou?
- Plano Alternativo: Se o plano apresentado pela empresa for rejeitado, os credores agora têm a prerrogativa de apresentar um plano alternativo, desde que cumpram determinados requisitos.
- Gestor de Confiança: Em caso de afastamento dos gestores da recuperanda, os credores podem indicar um "gestor de confiança" para assumir a administração da companhia.
- Impacto: Essas medidas equilibram as forças na negociação, incentivando a apresentação de planos mais realistas por parte do devedor e dando aos credores ferramentas para intervir ativamente na reestruturação.
Conclusão: Um Novo Cenário para a Reestruturação
A Lei nº 14.112/2020 modernizou a recuperação judicial no Brasil, tornando-a um processo mais dinâmico, transparente e alinhado às melhores práticas internacionais. As mudanças exigem uma nova postura de devedores, credores e advogados, que precisam adaptar suas estratégias a essa nova realidade jurídica.
Para a empresa em recuperação, é fundamental revisar seu plano e suas estratégias de negociação para se adequar às novas regras, especialmente no que tange às obrigações fiscais e à relação com os credores.
Seu plano de recuperação judicial está alinhado com as novas regras?
As mudanças na lei podem impactar diretamente a aprovação e o sucesso da sua reestruturação. Garanta que sua empresa esteja preparada.
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Este artigo tem caráter meramente informativo. Se a sua empresa está enfrentando dificuldades financeiras, é crucial buscar assessoria jurídica especializada para analisar as particularidades do seu caso e entender as opções disponíveis, incluindo a Recuperação Judicial. Uma consulta com um profissional experiente pode esclarecer seus direitos e indicar o melhor caminho a seguir.