Inclua Empréstimos Consignados na Lei do Superendividamento

Uma das maiores batalhas na defesa de um consumidor superendividado é travada em torno de uma dívida específica: o empréstimo consignado. Por ser descontado diretamente do salário ou benefício, muitos credores argumentam que ele seria "intocável" e não poderia entrar no plano de pagamento da Lei do Superendividamento. Isso é um mito perigoso.
Meu nome é Adriano Hermida Maia, e como advogado focado em reabilitação financeira, afirmo com a segurança da lei e da jurisprudência: os empréstimos consignados podem e devem ser incluídos na sua repactuação de dívidas. Neste artigo, vou explicar por que e como garantir que isso aconteça.
A Tese dos Bancos: Por Que Eles Dizem "Não"?
A principal alegação das instituições financeiras é que a Lei do Superendividamento exclui expressamente algumas dívidas do plano de pagamento, como financiamentos imobiliários e dívidas com garantia real. Com base nisso, eles tentam criar uma falsa equivalência, argumentando que o consignado, por ter o pagamento "garantido" pelo desconto em folha, também deveria ficar de fora.
Esse argumento é falho e vai contra o espírito da lei. A Lei nº 14.181/2021 foi criada para oferecer uma solução global e efetiva para o consumidor, permitindo que ele reorganize todas as suas dívidas de consumo para preservar seu mínimo existencial.
Excluir os empréstimos consignados, que frequentemente representam a maior fatia do endividamento, tornaria a lei ineficaz. Seria como tentar secar o chão com a torneira aberta.
A Visão da Justiça: O Objetivo é Proteger a Pessoa, Não o Contrato
Felizmente, o Poder Judiciário tem rechaçado a tese dos bancos de forma consistente. Os tribunais entendem que o objetivo maior da lei é a proteção da dignidade da pessoa humana. Se os descontos dos consignados, somados a outras dívidas, sufocam o devedor e consomem seu mínimo existencial, eles devem, obrigatoriamente, fazer parte do plano de renegociação.
A lógica é clara: o empréstimo consignado é uma dívida de consumo como qualquer outra, e o fato de o pagamento ser debitado na fonte não lhe confere um status privilegiado que se sobreponha a um direito fundamental.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO COM RELAÇÃO A TODAS AS DÍVIDAS DE CONSUMO . Recurso interposto contra decisão que julgou improcedente a ação com relação aos empréstimos consignados e determinou o prosseguimento da ação com relação ao contrato nº 125944911 referente ao Banco do Brasil. Exclusão dos empréstimos consignados da ação de repactuação de dívidas. Descabimento. Na verdade, o art. 104-A § 1º do CDC não excluiu os empréstimos consignados da ação de repactuação de dívidas. E, nessa linha, o artigo 4º, parágrafo único, inciso I, letra h mencionou os "empréstimos consignados" como exclusão do cálculo do mínimo existencial. Os empréstimos consignados não foram excluídos da possibilidade da repactuação. Ação judicial que visa implementar direitos básicos do consumidor, em especial a uma vida digna (inclusive sob enfoque material), modificação de cláusulas ou revisão de contratos, acesso aos órgãos judiciários, a facilitação dos direitos do consumidor em Juízo, tratamento do superendividamento, e garantia da preservação do mínimo existencial na conciliação e repactuação de dívidas, tudo nos moldes dos incisos I, V, VII, VIII, XI e XII do artigo 6º do CDC . Processamento da ação de repactuação de dívidas que se mostra necessário em relação também aos empréstimos consignados. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO.( TJ-SP — Agravo de Instrumento 2145091-53.2024.8.26.0000 Bauru, Relator.: Alexandre David Malfatti, Data de Julgamento: 18/06/2024, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/06/2024)
Em uma decisão exemplar, o Tribunal de Justiça de São Paulo afirmou que a lei não exclui os empréstimos consignados da repactuação. O TJSP destacou que o objetivo da norma é tratar o superendividamento de forma integral, e a exclusão desses contratos frustraria a finalidade de garantir o mínimo existencial ao consumidor.
Como Garantir a Inclusão dos Consignados no Seu Processo?
Para assegurar que seus empréstimos consignados sejam incluídos na negociação, a estratégia jurídica deve ser firme e bem fundamentada:
- Liste Todos os Contratos: Na petição inicial, seu advogado deve listar detalhadamente todos os credores e todas as dívidas, incluindo cada um dos contratos de empréstimo consignado, com seus respectivos valores e prazos.
- Não Aceite a Exclusão na Conciliação: É comum que, na audiência de conciliação, os representantes dos bancos insistam na exclusão dos consignados. É crucial que seu advogado se mantenha firme, argumentando com base na lei e na jurisprudência dominante.
- Peça a Intervenção do Juiz: Caso os credores se recusem a incluir os consignados no acordo, o caminho é pedir que o juiz instaure o processo para a criação de um plano de pagamento compulsório. Nesse momento, o juiz, com base nas decisões dos tribunais superiores, determinará a inclusão de todas as dívidas de consumo.
Essa postura encontra forte amparo na Justiça, que tem intervindo para garantir a aplicação correta da lei, mesmo diante da resistência dos credores. A jurisprudência confirma que a natureza do crédito não pode servir de pretexto para inviabilizar a recuperação financeira do devedor, como demonstra a seguinte decisão:
APELAÇÃO. PROCESSO CIVIL. CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO . REQUISITOS. AUSÊNCIA MÍNIMO EXISTENCIAL. COMPROMETIMENTO. NÃO DEMONSTRADO . REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. DESCABIMENTO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1 . Nos termos do parágrafo primeiro, do art. 54-A do Código de Defesa do Consumidor, para a comprovação do superendividamento são necessários o preenchimento de três requisitos cumulativos: a) impossibilidade manifesta de pagamento da totalidade das dívidas de consumo exigíveis e vincendas; b) boa-fé; c) comprometimento do mínimo existencial. 2. Não demonstrado o comprometimento do mínimo existencial pelo consumidor, descabe a repactuação de dívidas, na forma prevista na Lei do Superendividamento . 3. Apelação conhecida e não provida.( TJ-DF — 0741810-72.2023.8.07.0000 1839999, Relator.: EUSTÁQUIO DE CASTRO, Data de Julgamento: 05/04/2024, 8ª Turma Cível, Data de Publicação: 11/04/2024)
O TJDFT afirma que, preenchidos os requisitos de boa-fé e superendividamento, todos os credores de dívidas de consumo, inclusive os de empréstimos consignados, devem ser chamados ao processo para a audiência de conciliação, não cabendo a exclusão prévia de tais contratos.
Conclusão: Uma Defesa Completa para uma Solução Completa
Não permita que informações incorretas ou a pressão dos credores o impeçam de buscar uma solução completa para o seu endividamento. A Lei do Superendividamento foi desenhada para ser um recomeço, e isso só é possível quando todas as dívidas de consumo são colocadas na mesa de negociação, sem exceções injustificadas.
A inclusão dos empréstimos consignados não é uma "possibilidade", mas sim um direito seu. Como advogado especialista, meu papel é garantir que a lei seja aplicada em sua totalidade, utilizando os precedentes judiciais mais recentes para assegurar que seu plano de pagamento seja realista, justo e, acima de tudo, que ele devolva a você o controle sobre sua vida financeira.
Gostou do artigo? Deixe seu comentário, recomende e compartilhe com quem pode estar enfrentando essa situação. Estamos prontos para ajudar!
Aviso Legal: Este artigo tem caráter meramente informativo e não substitui a consulta a um advogado. Cada caso possui suas particularidades e deve ser analisado por um profissional qualificado.